O Mito Do Método

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Texto da Prof.ª. Miriam Cardoso sobre o mito do método científico.

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O MITO DO MÉTODO(*) Miriam Limoeiro Cardoso “Apoiar-se constantemente sobre uma filosofia como sobre um absoluto é realizar uma censura da qual nunca se estudou a legalidade”. Bachelard Em que consiste uma reflexão sobre o método? Numa epistemologia cartesiana o método se reduz a um conjunto de regras que por si só garantem a obtenção dos resultados desejados. O investigador que as conheça bem e que consiga agir puramente de acordo com elas chegará certamente a bom termo no seu trabalho. Haverá, portanto, modos – uns corretos, outros não – de atingir o conhecimento científico. Nesse sentido ele se identifica como técnica, suposta válida para utilização nos mais diversos domínios da ciência, que é assim considerada unicamente nos seus aspectos substantivos. O pesquisador é aqui levado a adotar os padrões aceitos e estabelecidos do “método científico”, sem uma discussão mais profunda dos critérios de cientificidade segundo os quais deva acatá-los e não a outros. Não explicitando esses critérios, dificulta-se a reflexão autêntica, necessariamente crítica, sobre o método. Ela se debate no interior do próprio método, encontra nele os seus limites e todas as tentativas de aprofundamento resultam num refinamento das proposições dele mesmo, que deste modo jamais se questiona. (*) Este artigo foi elaborado como fundamentação da minha exposição sobre “Método Científico”, seminário de Metodologia e Estatística, PUC/RJ, 19/01/1971. 2 Ver Piaget, J., 1967, especificamente p.51sg. A ciência contemporânea, de que a epistemologia cartesiana já não consegue dar conta1 e em que o fato mais significativo é o desenvolvimento do método estar-se fazendo cada vez mais no interior dela mesma2, apresenta a questão de forma bem mais complexa, tendendo sempre a se concretizar. O rigor necessário ao trabalho científico não permite que hoje se pretenda seguir à risca procedimentos estabelecidos. Ele tem conduzido na direção oposta, ou seja, à discussão da validade do seu emprego para o problema em estudo, a fim de poder realmente conhecê-lo, e isto só tem significado se este conhecimento apresentar o caráter de novidade, essencial ao desenvolvimento científico. Se é novo, é porque não é apenas uma cópia, uma reprodução, ainda que sofisticada. Assim, para ser novo há que não tenha sido feito mecanicamente, nem só por desdobramentos. O que crescentemente vai-se destacando em importância é a experiência, no sentido amplo de relação entre teórico e o real, no sentido específico de prova. Entende-se o método como parte de um corpo teórico integrado3, em que ele envolve as técnicas, dando-lhes sua razão, perguntando-lhes sobre as possibilidades e as limitações que trazem ou podem trazer às teorias a que servem, no trabalho sobre o seu objeto. A reflexão é aqui necessariamente retorno do método sobre si mesmo, questionamento dos seus próprios fundamentos, revisão crítica. Nesse sentido ela é fundamental ao exercício da ciência. Realizando sua pesquisa o cientista se ampara em teorias, que no confronto com o mundo que lhes concerne dão indicações, mostram lacunas e encaminham hipóteses. Como problematizar? Quais as formulações mais adequadas da investigação? Que caminhos seguir? 3 Para a exposição de noção de campo intelectual, embora apresente problemas cuja discussão parece conveniente, ver Bourdieu, P. , 1966 2 São os problemas concretos com que o pesquisador se defronta. Podese aceitar a comodidade da tentativa de tratar estes aspectos num grau de abstração tal que permita uma formalização capaz de universalizar perguntas e respostas. Findo o esforço, a tranquilidade de estar diante de um conjunto de preceitos que, sem atentar para pesquisadores particulares, nem para áreas específicas, nem para problemas concretos, trag